terça-feira, 25 de novembro de 2008

O PRIMEIRO MANIFESTO DO FUTURISMO: UMA ABORDAGEM CRÍTICA

Wendel Gonçalves de Deus

RESUMO:

O Manifesto Futurista, de autoria do poeta italiano Filippo Tommaso Marinetti (1876 - 1944), é publicado em Paris em 1909. Nesse primeiro, de uma série de manifestos veiculados até 1924, Marinetti declara a raiz italiana da nova estética: “... queremos libertar esse país (a Itália) de sua fétida gangrena de professores, arqueólogos, cicerones e antiquários". Falando da Itália para o mundo, o Futurismo coloca-se contra o "passadismo" burguês e o tradicionalismo cultural. À opressão do passado, o movimento opõe a glorificação do mundo moderno e da cidade industrial. A exaltação da máquina e da "beleza da velocidade", associada ao elogio da técnica e da ciência, torna-se emblemática da nova atitude estética e política. Outra sensibilidade condicionada pela velocidade dos meios de comunicação, está na base das novas formas artísticas futuristas.

PALAVRAS-CHAVE:

Violência; choque; velocidade; tecnologia; novo.


INTRODUÇÃO

As mudanças tecnológicas por que o mundo passou na virada do nosso século transformaram as maneiras de o homem perceber a realidade. O automóvel, o avião, o cinema deslocaram e aceleraram o olhar do homem moderno. Em meio a essas transformações, surgem várias manifestações artísticas – Impressionismo, Expressionismo, Futurismo, Cubismo, Dadaísmo, Surrealismo -, que ficariam conhecidas como “correntes de vanguarda” e que, conjugadas, dariam origem ao Modernismo. Neste trabalho discutiremos pontos importantes e trechos do Primeiro Manifesto do Futurismo (1909).


O FUTURISMO

O Futurismo foi o primeiro movimento artístico e literário que teve origem no início do século XX, antes da Primeira Guerra Mundial, e que se desenvolve na Europa, sobretudo na Itália, não se restringiu apenas à arte, mas na verdade, abrangeu vários campos da experiência humana, tendo participado também da literatura, artes plásticas, música, costumes e da política. Teve seu apogeu entre 1909 e 1920 e nele havia uma enorme vontade de começar tudo de novo. Afirmava-se que sua história divide-se em três fases:
1° fase de 1905-1909, em que defende o princípio do verso livre, que era aquele que não tinha métrica, nem rimas fixas.
2° fase de 1909-1919, onde valorizava a “imaginação sem fio” e as “palavras em liberdades, ou seja, não mais as regras da sintaxe gramatical.
3° fase de 1919 em diante, quando se vincula ao fascismo.
O líder dos futuristas foi o poeta ítalo-francês Felippo Tommaso Marinetti, com seus trabalhos, que estudara em Paris, onde publicou La conquête des étoiles (1902) e Destruction (1904), livros que despertaram o interesse de escritores de créditos já firmados na época como P. Claudel. Como principais representantes da escola italiana de Marinetti tiveram: Paolo Buzzi (1874-1956), Ardengo Soffici (1879-1964), Giovanni Papini (1881-1956), Enrico Cavacchioli (1884-1954), Corrado Govoni (1884-1965), Aldo Palazzeschi (1885-1974), Luciano Folgore (1888-1966). Mas foi Marinetti o maior protagonista do Futurismo e foi ele quem elaborou o primeiro manifesto futurista, publicado, na primeira página do jornal Le Figaro, em 1909.
Um manifesto repleto de frases retóricas e de radicalismo dialético, mostrava as impetuosas alegrias do Futurismo e a aceitação do moderno mundo tecnológico: máquinas, produção em massa, sons mecânicos, velocidade e a destruição de tudo o que era velho.
Então, com o vulto coberto pela boa lama das fábricas - empaste de escórias metálicas, de suores inúteis, de fuliges celestes -, contundidos e enfaixados os braços, mas impávidos, ditamos nossas primeiras vontades a todos os homens vivos da terra: 1.Queremos cantar o amor do perigo, o hábito da energia e da temeridade.2.A coragem, a audácia e a rebelião serão elementos essenciais da nossa poesia. 3. Até hoje a literatura tem exaltado a imobilidade pensativa, o êxtase e o sono. Queremos exaltar o movimento agressivo, a insônia febril, a velocidade, o salto mortal, a bofetada e o murro.4. Afirmamos que a magnificência do mundo se enriqueceu de uma beleza nova: a beleza da velocidade. Um carro de corrida adornado de grossos tubos semelhantes a serpentes de hálito explosivo... um automóvel rugidor, que parece correr sobre a metralha, é mais belo que a Vitória de Samotrácia.
No fragmento acima, percebemos claramente que a arte era colocada pelos futuristas como uma forma de choque, neste sentido suas poesias eram repletas de coragem, audácia e revolta, pois a caráter agressivo de Marinetti revelava a grande vontade de criar um impacto. Segundo os futuristas, a arte do passado tendia à meditação, daí a idéia de sono no fragmento 3, pois em aversão a isto, eles pregaram uma arte insone, de olhos abertos para a vida presente, capaz de proclamar o futuro. Já no fragmento 4, os futuristas citam um novo conceito de beleza, pois não há mais a distinção entre beleza e feiúra, tudo era visto como uma arte, arte essa que é manifestada como uma força violenta. O Futurismo propôs uma apreciação profunda à civilização técnica, por esse motivo, a grande paixão deles era o automóvel, as máquinas, o avanço tecnológico do século XX, a industrialização, tudo isso era mais belo do que a famosa escultura italiana “Vitoria de Samotrácia” citada no fragmento.
5. Queremos celebrar o homem que segura o volante, cuja haste ideal atravessa a Terra, lançada a toda velocidade no circuito de sua própria órbita.6. O poeta deve prodigalizar-se com ardor, fausto e munificência, a fim de aumentar o entusiástico fervor dos elementos primordiais.7. Já não há beleza senão na luta. Nenhuma obra que não tenha um caráter agressivo pode ser uma obra-prima. A poesia deve ser concebida como um violento assalto contra as forças ignotas para obrigá-las a prostrar-se ante o homem.
Nestes fragmentos, percebemos de forma clara o amor futurista ao mundo presente, as grandes cidades eram cenários bem valorizados, devido estarem repletas de máquinas, de automóveis, em velocidade constante, graças ao progresso e o urbanismo da época.. Marinetti insistia na idéia da violência, do choque e do agressivo, para os futuristas a beleza estava na luta, na guerra e no combate.
8. Estamos no promontório extremo dos séculos!... Por que haveremos de olhar para trás, se queremos arrombar as misteriosas portas do Impossível? O Tempo e o Espaço morreram ontem. Vivemos já o absoluto, pois criamos a eterna velocidade onipresente.9. Queremos glorificar a guerra - única higiene do mundo -, o militarismo, o patriotismo, o gesto destruidor dos anarquistas, as belas idéias pelas quais se morre e o desprezo da mulher.10. Queremos destruir os museus, as bibliotecas, as academias de todo tipo, e combater o moralismo, o feminismo e toda vileza oportunista e utilitária.
Quando Marinetti cita: “... O Tempo e o Espaço morreram ontem..”, há uma grande consagração ao futuro, o repúdio ao passado, a idéia da força ilimitada que possui o super-homem moderno. O canto à guerra, a violência como um elemento de higiene do mundo, tornam-se componentes acríticos do Futurismo. Essa idéia de destruição a tudo o que fosse velho, é a glorificação do novo, “é novo para o meu tempo e não serve para o futuro” uma das intenções de Marinetti.
11. Cantaremos as grandes multidões agitadas pelo trabalho, pelo prazer ou pela sublevação; cantaremos a maré multicor e polifônica das revoluções nas capitais modernas; cantaremos o vibrante fervor noturno dos arsenais e dos estaleiros incendiados por violentas luas elétricas: as estações insaciáveis, devoradoras de serpentes fumegantes: as fábricas suspensas das nuvens pelos contorcidos fios de suas fumaças; as pontes semelhantes a ginastas gigantes que transpõem as fumaças, cintilantes ao sol com um fulgor de facas; os navios a vapor aventurosos que farejam o horizonte, as locomotivas de amplo peito que se empertigam sobre os trilhos como enormes cavalos de aço refreados por tubos e o vôo deslizante dos aeroplanos, cujas hélices se agitam ao vento como bandeiras e parecem aplaudir como uma multidão entusiasta.É da Itália que lançamos ao mundo este manifesto de violência arrebatadora e incendiária com o qual fundamos o nosso Futurismo, porque queremos libertar este país de sua fétida gangrena de professores, arqueólogos, cicerones e antiquários.
As grandes multidões agitadas pelo trabalho, Marinetti se refere à cidade de Paris, ele canta esse tipo de cidade, dando ênfase ao caráter urbano de sua arte, coloca a cidade como musa, a fonte de inspiração do poeta futurista. Há um grande uso de metáforas e adjetivações, como citado “luas elétricas”, concretizando a idéia de amor ao mundo presente, a tecnologia, a máquina, ao progresso técnico do mundo moderno. Ao lançar ao mundo o manifesto de violência, Marinetti enfatiza o caráter patriótico de nacionalismo dos futuristas. Enfim, percebemos que no primeiro manifesto do Futurismo (1909), Marinetti apelava não só a uma ruptura com o passado e com a tradição, mas também exaltava um novo estilo de vida, de acordo com o dinamismo dos tempos modernos. No plano literário, a escrita e a arte são vistas como meios expressivos na representação da velocidade, da violência, que exprimem o dinamismo da vida moderna, em oposição a formas tradicionais de expressão. Rompe-se com a tradição aristotélica no campo da literatura, que já estava enraizada na cultura ocidental. O Futurismo contesta o sentimentalismo e exalta o homem de ação. Destaca-se a originalidade, que Marinetti procura pelo elogio ao progresso, à máquina, ao motor, a tudo o que representa o moderno e o imprevisto.


BIBLIOGRAFIA

HELENA, Lúcia, Movimentos da Vanguarda Européia. Coleção Margem do Texto.
São Paulo: Editora Scipione Ltda, 1993.

MUNIZ, Dina e CEIA, Carlos. Futurismo.In:http:// www..fcsh.unl.pt.edt/verbetes

VERONESE, Cesar. Vanguardas Européias.In:http:// www.portrasdasletras.com.br

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